segunda-feira, 12 de maio de 2014

Antiprotozoarios


Os protozoários são organismos eucariontes, unicelulares, heterotróficos e podem ser de vida livre ou fazer parte de colônias. Eles apresentam diversas fases em seu ciclo biológico, desde trofozoítos, que são as formas ativas e que exercem a ação patogênica, até os oocistos, que são a forma de resistência e a forma sexuada. Por viverem em meio aquoso, ou seja, são encontrados na água ou em algum líquido, o que torna sua sobrevivência no organismo animal facilitada, já que o mesmo é composto em aproximadamente 70% do seu volume de água, tendo sua instalação mais intensa no trato digestório e sangue, podendo, em menor quantidade, se instalar no sistema genital, linfático, coração e pele.
Devido a tantas formas de doenças que podem acometer animais de diversas espécies é que se faz crucial o controle com medicamentos antiparasitários, além de uma observação diária do comportamento dos mesmos para diagnósticos e tratamentos mais específicos. É fundamental conhecer o ciclo biológico destes protozoários para criar programas de combate e controle do parasita.



COCCIDIOSE

As infecções pelas coccídias (Eimeria, Isospora, Cystoisospora, Cryptosporidium) são infecções parasitárias causadas por protozoários microscópicos que podem afetar diferentes espécies animais. Cães e gatos são suscetíveis às espécies Isospora, Sarcocystis e Hammondia, e somente os gatos são suscetíveis a Toxoplasma e Besnoitia. A coccídia mais comum que afeta estes animais é a do gênero Isospora, sendo I. rivolta e I. felis em gatos, nos cães as espécies I. canis, I. burrowsi, I. neorivolta e I. ohioensis. Animais jovens submetidos a sistemas de confinamento ou estresse podem sofrer infecções clínicas por Isospora sp., Cystoisospora sp., Toxoplasma, Besnoitia, Sarcocystis e Hammondia. Coccídias afetam o trato intestinal frequentemente. Exceto Cryptosporidium parvum, todas as espécies são específicas do hospedeiro. As coccídias mais comuns pertencem ao gênero Cystoisospora, as espécies C. rivolta e C. felis em gatos, nos cães as espécies C. canis, C. burrowsi, C. neorivolta e C. ohioensis.
O filhote fica exposto ao organismo a partir de fezes da mãe, podendo ingerir as fezes contendo cistos que se desenvolvem no intestino do animal. Filhotes lactentes podem eliminar oocistos por até cinco semanas, enquanto os filhotes desmamados os eliminam durante duas semanas, devido a imaturidade do sistema imune. Os cães adultos e gatos podem se infectar através da ingestão de solo contendo cistos coccídias. Eles podem até comer fezes ou intestinos de outros animais infectados, como roedores.
Tratamento
O tratamento consiste em duas drogas que têm elevadas taxas de sucesso. Estas drogas incluem sulfadimetoxina (via oral ou parenteral), na dosagem de 55 mg/kg/dia, em dose única ou fracionada durante 21 dias. Trimetoprim / sulfadiazina também pode ser utilizado. O amprólio pode ser empregado como preventivo em fêmeas adultas 10 dias antes do parto, na proporção de 30 ml da solução de amprólio a 9,6% em 3,8 litros de água de beber, porém seu uso não foi aprovado em alguns países, como Estados Unidos e a União Europeia. Ele atua na regulação da absorção de tiamina pela coccídia, enquanto o modo de ação destas drogas não mata a coccídia nos intestinos, ele apenas ajuda na prevenção do parasita de se reproduzir. Portanto, a velocidade a que o animal se recupera da infecção é muito lenta (cerca de 2 semanas, se o tratamento for adequado), tempo esse que depende do reestabelecimento do equilíbrio do sistema imune do organismo que é atingido pelo parasita.
Em gatos afetados, a associação sulfatrimetoprim pode ser usada na dose máxima de 60 mg/kg, por 1 semana. Para tratamento sintomático, pode-se utilizar a sulfadimetoxina (via oral ou parenteral) na dose de 50 mg/kg no primeiro dia de tratamento e 25 mg/kg, diariamente, por 2 ou 3 semanas.
         Outros protocolos de tratamento podem ser usados no combate de Sarcocystis, Hammondia, Cystoisospora, Toxoplasma e Neospora, como o uso de Clindamicina oral 12,5 a 18,5 mg/kg 2 vezes ao dia por 4 semanas. Também pode ser usada uma associação de Sulfadianzina 30 mg/kg + Pirimetamina 0,25-0,5 mg/kg/dia a cada 12 horas por 3 a 4 semanas.


TOXOPLASMOSE

O Toxoplasma gondii é um coccídio que parasita o intestino delgado de membros da família Felidae, inclusive o gato doméstico. Estes animais constituem os hospedeiros definitivos deste parasito, portanto eliminam seus oocistos nas fezes e contaminam o meio ambiente. Após um período de 1 a 5 dias, os oocistos esporulam, tornando-se infectantes para um grande número de espécies de animais de sangue quente, inclusive o próprio gato, o cão e o homem. Nestes animais, hospedeiros intermediários, os esporozoítos liberados dos oocistos penetram nas células intestinais e se multiplicam. Invadem também linfonodos, onde formam taquizoítos que se espalham por todos os tecidos do hospedeiro, inclusive cérebro, músculos estriados e fígado. Pode também ocorrer migração transplacentária. O cão, apesar de não ser hospedeiro definitivo, contribui na disseminação mecânica desta protozoose, e o gato, que é o hospedeiro definitivo, está relacionados com a produção e eliminação dos oocistos, favorecendo a perpetuação da doença, uma vez que somente nele ocorre a reprodução sexuada dos parasitos.
Cerca de 60% dos animais de estimação que têm toxoplasmose pode se recuperar com o tratamento. A recuperação é menos provável em animais novos ou que possuem a supressão severa do seu sistema imune.

Tratamento
Em uma revisão das alternativas terapêuticas utilizadas para cães foi relatado o uso de sulfadiazina, pirimetamina, clindamicina, fosfato de clindamicina, e cloreto de clindamicina, lembrando-se que estas drogas são utilizadas, em sua maioria, próximo às doses tóxicas para que sejam efetivas, devendo ser utilizado tratamento de apoio, de acordo com os sinais apresentados pelos animais.
Não existe um tratamento completamente satisfatório. A clindamicina é o medicamento de escolha para cães e gatos, que é bem absorvida quando administrada por via oral. Liga-se facilmente às proteínas plasmáticas, distribuindo-se por vários tecidos, inclusive atravessa a barreira placentária, porém não atinge o sistema nervoso central. Para cães com toxoplasmose sistêmica, recomenda-se a dose 10-40 mg/kg via oral, dividida em 3 a 4 vezes/dia; para gatos , recomenda-se 40 mg/kg via oral, divididos em 3 vezes/dia, durante 14 dias. Embora se tenha relatado a utilização de clindamicina, que tem sucesso para o tratamento da miosite provocada pelo agente, a mesma não alcança concentrações terapêuticas, no sistema nervoso central. A toxoplasmose ocular felina deve ser tratada com clindamicina na dose de 12 mg/kg, duas vezes ao dia, durante 4 semanas, ou sulfa-trimetoprim na dose de 15 mg/kg, duas vezes ao dia, durante 4 semanas.
Em gatos, como terapia adjuvante contra uveíte, pode ser administrado colírio de prednisona a 1%. Uma combinação da droga pirimetamina com a sulfadiazina (Tribrissen) foi descrita como eficaz contra taquizoítos, mas não contra bradizoítos, porém é bastante tóxica em gatos.
Sulfonamidas, inibidores do dihidrofosfato redutase e timodilato sintetase e antibióticos ionóforos (lasolocida, narasina e salinomicina), macrolídeos, tetraciclinas e lisonaminas tem ação sobre taquizoítos, e drogas como metronidazol, paramomicina e roxarsona exercem pouca ou nenhuma atividade sobre estas formas evolutivas de multiplicação rápida, sendo a associação de medicamentos mais eficiente. Sinergismo pode ocorrer em sulfonamidas com pirimetamina, monesina ou toltrazuril e sulfonamidas com ormetropina, diaveridina e trimetropin, cloridrato de clindamicina e sulfa associada ao trimetropin.

Cloridrato de clindamicina pode ser utilizado na dosagem de 3 a 20 mg / Kg, e também, na posologia de 12,5 a 25 mg / Kg, por via oral, a cada 12 horas por uma a duas semanas para encurtar o tempo de eliminação do oocisto. Os sinais clínicos da toxoplasmose se resolvem dentro de dois a quatro dias com a administração deste medicamento.
Ácido folínico (0,5 a 5 mg /dia) pode ser empregado para prevenção das complicações hematológicas ocasionadas pelo tratamento com pirimetamina. Fármacos contra Toxoplasma em combinação com corticosteróides tópicos, orais ou parenterais, podem ser utilizados para evitar danos oculares secundários à inflamação. A recorrência é comum se a duração do tratamento for menor que quatro semanas e havendo imunodeficiência, o prognóstico é ruim.



 Fonte: SARAIVA et al., 2008.

Medicamentos anticoccidianos:

Pirimetamina: é um fármaco que atua na inibição da enzima dihidrofolato redutase (DHFR), a qual é importante na síntese do ácido fólico.
Clindamicina: é um fármaco da classe das lincosaminas que age inibindo a síntese proteica. Atua como um agente bacteriostático, penetra no meio intracelular. A clindamicina possui atividade imunoestimuladora, pois potencializa a opsonização e acelera a quimiotaxia e fagocitose dos leucócitos. É absorvida por via oral e parenteral. Pode ser ingerida concomitantemente com os alimentos, sem prejuízo à sua absorção. Distribui-se amplamente pelos tecidos. Não atravessa satisfatoriamente a barreira hematoencefálica, porém atravessa a barreira placentária. Apresenta elevada concentração no tecido ósseo e articular. Atravessa as membranas celulares atingindo elevadas concentrações no meio intracelular. É metabolizada no fígado e a eliminação dos seus metabólitos é pela urina, bile e fezes.

Amprólio (antagonista de tiamina): atua na regulação da absorção de tiamina pela coccídia, enquanto a sulfaquinoxalina atuam na inibição das vias metabólicas do ácido fólico e do ácido para-aminobenzoico (PABA). A administração de 125 ppm proporciona uma boa eficácia contra um inóculo misto de Eimeria acervulina, E. maxima, E. brunetti, E. tenella. A eficiência do amprólio contra a E. acervulina e a E. tenella é comprovada principalemnte quando associado à sulfaquinoxalina. A associação de 240 ppm de amprólio e 180 ppm de sulfaquinoxalina é eficaz contra E. acervulina, E. maxima, E necatrix, E. brunetti e E. tenella. As associações destas substâncias são recomendadas, pois ocorre o sinergismo dos efeitos destes medicamentos contra as eimerias. Relatos indicando a resistência de alguns isolados de E. acervulina têm sido demonstrados, porém a resistência a este composto ocorre lenta e parcialmente. O amprólio age nos esquizontes de 1ª e 2ª geração.

Sulfonamidas: age contra esquizontes de 2ª geração, sendo menos efetiva contra os estágios assexuados das eimerias. Têm como mecanismo de ação o bloqueio das vias metabólicas do ácido fólico e do PABA. Dentro do grupo destaca-se a sulfaquinoxalina como a mais potente e de menor toxicidade, apesar de apresentar espectro de ação limitado a algumas espécies de eimerias.

Toltrazurila (triazinona simétrica): pertence à classe das triazinonas simétricas, com propriedades coccidicidas de alta eficiência. Atua em diferentes formas evolutivas do parasito, principalmente nos esquizontes, nos macro e microgametócitos, alterando a função da cadeia respiratória e as enzimas mitocondriais.

Trimetoprima: é um análogo do ácido fólico e como tal o substitui na enzima dihidrofolato reductase bacteriana que o sintetiza. É, portanto, um antagonista do ácido fólico, inibindo a sua formação pela bactéria. O ácido fólico é essencial para a replicação das bactérias, já que é usado na duplicação do DNA. Este antibiótico não mata as bactérias, mas inibe a sua multiplicação (é bacteriostática) permitindo ao sistema imune elimina-las facilmente. A trimetoprima é ativa contra a maioria dos patógenos bacterianos comuns. Ela é, às vezes, usada em uma mistura com sulfametoxazol, em uma combinação chamada de co-trimoxazol. Como as sulfonamidas inibem a mesma via metabólica bacteriana, porém acima do local de ação da dihidrofolato redutase, elas podem potencializar a ação da trimetoprima.

REFERÊNCIAS
SPINOSA, H.S; GÓRNIAK, S.L; BERNARDI, M.M. Farmacologia Aplicada à Medicina Veterinária. 5ª ed., Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 2011.
SARAIVA, K. D. B. et  al. Toxoplasmose canina: aspectos clínicos e patológicos. Ciências Agrárias, v. 29, n. 1, p. 189-202, 2008.
FONSECA, A. H. Coccidiose em animais domésticos. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
GERMANI, C. F.; CAETANO, M. T.; PACHECO, F. A. A. Toxoplasmose animal no Brasil. Acta Scientiae Veterinariae. 37(1): 1-23, 2009.
NEGRI, D.; CIRILO, M. B.; SALVARANI, R. S.; NEVES, M. F. Toxoplasmose em cães e gatos. Revista científica eletrônica de medicina veterinária. Ano VI, n. 11, 2008.




BABESIOSE



         A Babesiose é uma doença protozoariana, provocada pela Babesia canis, que parasita as hemácias e as destróis, resultando em anemia hemolítica do tipo regenerativa. Sua transmissão se dá pelo carrapato castanho (Rhipicephalus sanguineos, Dermacentor spp., Haemaphysalis leachi e Hyalomma plumbeum) ou por transfusões sanguíneas. A Babesia canis é um hematozoário relativamente grande que parasita as hemácias, apresentando-se sob formas arredondadas, irregulares e em pêra. Formas arredondadas ou ameboides podem ser encontradas no plasma sanguíneo.   
Figura 1 Formas intra-eritrocíticas de Babesia canis. Sangue periférico de cão. 


 Fonte: Gardiner et al., 1998
                Animais de áreas onde há estabilidade enzoótica para essas parasitoses adquirem a infecção sem apresentar sintomatologia clínica aguda. Por outro lado, aqueles de regiões indenes, quando introduzidos numa área onde existe o hematozoário, sofrem a doença de forma severa, que pode levar ao óbito.
                O tratamento da babesiose canina está direcionado para o controle do parasita, moderação da resposta imune e tratamento sintomático. Alguns medicamentos usados com essa finalidade foram atualmente substituídos por outros mais eficientes e com maior margem de segurança. O azul tripan, por exemplo, era administrado na dosagem de 10 mg/kg em solução a 1%, via intravenosa, mas tinha um alto risco, já que se ocorresse extravasamento acidental da veia, causaria necrose tecidual.
         Os fármacos mais recomendados atualmente são o aceturaro de diminazeno (uma diamidina) e o dipropionato do imidocarb (uma cabanilida), que serão descritos a seguir:


Diminazeno
         Diminazeno é a droga comumente usada em todo mundo e é efetiva para o tratamento da B. canis quando administrada pela via intramuscular, em dose única de 2,5 a 3,5 mg/kg. Porém, para o tratamento da B. gibsoni, a dose deve ser repetida após 24 horas.
         As diamidinas interferem na glicólise e também na síntese do DNA do parasita, ocasionando dilatação da membrana de organelas, dissolução do citoplasma e destruição da membrana de organelas, dissolução do citoplasma e destruição do núcleo. As diamidinas acumulam-se no fígado e rins, e entram na circulação fetal; além disso, pequenas quantidades ficam acumuladas no sistema nervoso central durante alguns meses.
         Esse medicamento é bem tolerado, mas em doses terapêuticas múltiplas em cães podem causar lesões nervosas graves, principalmente ao nível do cerebelo, mesencéfalo e tálamo, além de degeneração gordurosa no fígado, rins, miocárdio e musculatura esquelética.


Dipropinato de imidocarb
         O dipropinato de imidocarb também é muito efetivo no tratamento da babesiose, sendo recomendado na dosagem de 5 a 7 mg/kg, por via intramuscular ou subcutânea sendo recomendada duas aplicações com um intervalo de quatorze dias. A fenamidinina também é uma opção, na dose de 15 mg/kg/dia por via subcutânea, em dois dias consecutivos.
         Este fármaco atua provocando alterações morfológicas e funcionais do núcleo e do citoplasma do parasita. Este composto apresenta tendência de se depositar no rim e é reabsorvido de forma inalterada, sendo metabolizado pelo fígado.
         Cães de áreas onde não há B. canis e que viajem para áreas endêmicas podem ser tratados profilaticamente com uma injeção subcutânea de imidocarb na dose de 6 mg/kg, ficando protegidos por duas semanas, e de doxiciclina* na dose de 10 mg/kg, duas vezes ao dia por onze dias.
         *A doxiciclina pertence ao grupo das tetraciclinas e, apesar de ser um antibiótico bacterisotático, por inibir a síntese proteica dos microorganismos sensíveis, também possui ação antimicrobiana sobre alguns protozoários, como a Babesia canis.


Efeitos Colaterais
          Os efeitos colaterais que podem ser observados com o tratamento com o cão imidocarb ou diamidinas são: depressão, vocalização contínua, opistótono, ataxia, rigidez extensora, nistagmo e convulsões. Outros efeitos adversos apresentados pelos animais incluem salivação trasitória, diarreia, dispneia, lacrimejamento, depressão e vômitos. Também podem apresentar dor no local de aplicação. Para evitar efeitos colinérgicos indesejados, recomenda-se o uso do sulfato de atropina na dosagem de 0,04 mg/kg, dez minutos antes da aplicação do imidocarb.




CRIPTOSPORIDIOSE



Cryptosporidium é um coccicídio que infecta uma ampla variedade de vertebrados, incluindo o homem. O parasito se localiza principalmente no intestino delgado dos mamíferos e aves. Em cães infectados naturalmente, foram isolados oocistos de C.parvum e C.canis, sendo o C. muris encontrado em cães infectados experimentalmente. Dessas três espécies acredita-se que o C. canis seja a única clinicamente significante para cães.
         É considerado um parasito oportunista; em hospedeiros imunocompetentes a infecção é auto-limitante, com duração de poucos dias a três semanas. Em hospedeiros imunocomprometidos a infecção pode resultar em diarreia crônica debilitante, desidratação, má-absorção, enfraquecimento progressivo e morte. No entanto, em indivíduos muito novos ou velhos ou em tratamento que possa causar imunossupressão são os mais severamente afetados. Estes animais frequentemente precisam de tratamento para eliminar o parasito.
         Fármacos como a azitromicina, tilosina, paromomicina e nitazoxanida têm sido utilizados em cães com criptosporidiose, mas o número de estudos publicados ainda é reduzido o que não permite obter protocolos seguros e consistentes, devendo o tratamento ser ajustado de acordo com as necessidades de cada paciente. A paromicina não deve ser administrada a animais com diarreia devido a possibilidade de ocorrer absorção com consequente nefrotoxicidade.


Protocolos para o tratamento de infecções por Cryptosporidium no cão.
Fármaco
Protocolo
Azitromicina
10mg/kg, PO, SID, até resolução dos sinais clínicos.
Nitazoxanida
25 mg/kg, PO, durante pelo menos 7 dias.
Paromomicina
125 a 165 mg/kg, PO, SID ou BID durante pelo menos 5 dias.
Tilosina
10 a 15 mg/kg, PO, BID ou TID, durante 21 dias.
Fonte: Scorza e Tangtrongsup, 2010



REFERÊNCIAS
MELO, F. L.; LEBRE, C. R. Rastreio de parasitas gastrintestinais e seu impacto zoonótico em cães de canil da cidade de Lisboa. Universidade Técnica de Lisboa. Lisboa. 2011
PIMENTEL, F. F.; ALMEIDA, A. J. de; OLIVEIRA, F. C. R. de; EDERLI, B. B. Efeito do tratamento com nitazoxanida na criptosporidiose canina. Arq. Ciênc. Vet. Zool. UNIPAR, Umuarama, v. 14, n. 2, p. 107-112, jul./dez. 2011.

GARDINER, C.H.; FAYER, R.; DUBEY, J.P. An Atlas of Protozoan Parasites in Animal Tissues. Ed. 2. Armed Forces Institute of Pathology, Washington, 1998
FIGUEIREDO, M.R. Babesiose e erliquiose caninas. Rio de Janeiro, 2007
CORREA, A.R. et al. Babesiose canina: relato de caso. Revista científica eletrônica de medicina veterinária. Ed. 4, 2005
ANTONIO, N.S.; OLIVEIRA, A.C.; ZAPPA, V.; Babesia canis: relato de caso. Revista eletrônica de medicina veterinária. São Paulo. Ed.12, 2009
ANDRADE, E.S.; Infecções causadas por hematozoários em cães e gatos de ocorrência no Brasil: semelhanças e particularidades. Porto Alegre, 2007.
SPINOSA, H.S.; GÓRNIAK, S.L.;BERNARDI, M.M.; Farmacologia Aplicada à Medicina Veterinária. São Paulo: Editora Guanabara Koogan, p. 502-503, 2002.



GIARDÍASE



A giardíase é uma infecção comum em animais, sendo causada por um protozoário flagelado do gênero Giardia, pertencente à ordem Diplomonadida (URQUHART et al., 1987). Os animais eliminam os cistos de parasitas nas fezes após um período de pré-patência de uma a duas semanas, neste período estes podem apresentar ou não sinais clínicos da enfermidade (VIGNARD-ROSEZ; ALVES;BLEICH, 2006). Giardia spp.., em sua forma parasitária, o trofozoíta, se prende às células epiteliais do intestino delgado, causando-lhes lesões. Em animais jovens, sobretudo cães, altas infestações podem causar enterites, com episódios intercalados de parada do trânsito intestinal (constipação) e diarreias.
Dos protozoários que freqüentemente acometem os animais e o homem, Giardia spp. tem despertado grande interesse, pelo seu potencial como agente de zoonose, além de causar, em animais jovens, diarreia intermitente com comprometimento da digestão e absorção de alimentos, acarretando desidratação, perda de peso e morte. Os sinais clínicos podem ser autolimitantes em alguns pacientes e a doença grave ocorre em filhotes e em animais com doenças concomitantes ou debilitados (ROBERTS-HOMSON et al., 1976; ADAM, 1991).


Tratamento:

- Metronidazol
         Esse medicamento, após entrar na célula-alvo (trofozoíto), interage com o DNA do protozoário, ocasionando perda de sua estrutura helicoidal e quebra das alças dessa estrutura. Pelo fato de ser pouco solúvel em água e etanol, recomenda-se sua administração por via oral. Parte deste medicamento é biotransformada e aproximadamente 50% são excretados inalterados na urina. É empregado na dose de 25 mg/kg duas vezes ao dia por cinco dias, em cães; e para gatos a dose é de 12-25mg/kg duas vezes ao dia, por 5 dias. Cães tratados com altas doses deste medicamento, tendem a apresentar sinais de intoxicação com consequente disfunção do sistema nervoso central, sendo representados por ataxia, tremores, nistagmo vertical, opistótono, espasmos de musculatura lombar e dos membros posteriores e cauda caída.


- Cloridrato de Quinacrina ou cloridrato de mepacrina
         É administrado, geralmente, por via oral ou, com menor frequência, pela via intramuscular. Distribui-se nos tecidos, com tendência de se acumular no fígado, baço, pulmões e glândulas adrenais. Sua eliminação faz-se lentamente pela urina e quantidades muito pequenas são eliminadas pelas secreções corpóreas (bile, saliva, suor, leite).
         Recomenda-se para animais de grande porte a dose de 200mg/animal, três vezes no primeiro dia e duas vezes nos cinco dias subsequentes. Para cães de raças pequenas é recomendado a dose de 100 mg, duas vezes no primeiro dia e uma vez ao dia por mais 5 dias. Para filhotes, utilizam-se 50 mg duas vezes ao dia, durante cinco dias. Sugere-se administração de bicarbonato para prevenir vômitos. Para cães com fibrilação auricular, a dose de 2,64 mg/kg, pela via intravenosa, permite reestabelecer o ritmo sinusal normal.
         Doses a cima do recomendado podem originar um quadro toxico, representado por vômitos e distúrbios das atividades motora e psicomotora tanto em cães como em gatos.


- Tinidazol
         Fármaco da mesma classe que o metronidazol (classe dos nitroimidazois), sendo recomendado na dose de 44 mg ao dia, durante 3 dias.


- Anti-helminticos                    
Outros fármacos utilizados para o tratamento da giardíase são os anti-helmínticos, sendo os mais utlizados os benzimidazóis. Indica-se albendazol  na dose de 25 mg/kg, duas vezes ao dia, durante 2 dias, suspeita-se que tenha efeito teratogênico, não sendo recomendado para fêmeas prenhes. Já fembendazol, é indicado na dose de 50mg/kg/dia, durante 3 dias (não foi testado em gatos).


- Furazolidona
         Essa droga sofre uma ativação reduzida no trofozoíto, que é pouco provável ao metronidazol, essa redução provavelmente ocorre via uma NADH oxidase (38, 244). Seu efeito de morte está relacionado com a toxicidade dos produtos reduzidos, os quais podem danificar importantes componentes celulares, incluindo o DNA. A droga é prontamente absorvida pelo trato gastrointestinal e é metabolizada rapidamente nos tecidos. (referencia 143).
         Estudos clínicos usando furazolidona são numerosos e tem como resultado uma ampla gama de doses e horários administrações. Entretanto, sua eficácia tem sido geralmente considerada como sendo ligeiramente menor do que os de metronidazol e quinacrina. Outro fator importante é o efeito inibitório de uma monoamina oxidase (MAO) que a drogra possui, sendo assim, nunca deve ser administrada concomitantemente a indivíduos já a tomar inibidores da MAO. (artigo do tratamento da giárdia em inglês).



REFERÊNCIAS
ADAM, R. D. The biology of Giardia spp. Microbiological Reviews, Washington, v.55, n.1, p.706–732, 1991.
Brown, D. M., J. A. Upcroft, and P. Upcroft. 1996. A H2O-producing NADH oxidase from the protozoan parasite Giardia duodenalis. Eur. J. Biochem. 241:155–161.

Gardner, T. B., & Hill, D. R. (2001). Treatment of giardiasis. Clinical Microbiology Reviews, 14(1), 114-128.

Kucers, A., S. M. Crowe, M. L. Grayson, and J. F. Hoy. 1997. Nitrofurans: nitrofurazone, furazolidone and nitro furantoin, p. 922-923. In A. Kucers, S. M. Crowe, M. L. Grayson, and J. F. Hoy (ed.), The use of antibiotics. A clinical review of antibacterial, antifungal, and antiviral drugs, 5th ed. Butterworth-Heinemann, Oxford, United Kingdom.

da Silva, A. S., da Silva, M. K., Oliveira, C. B., Zanette, R. A., & Monteiro, S. G. (2008). Eficácia de drogas contra Giardia muris em camundongos Mus musculus naturalmente infectados. Semina: Ciências Agrárias, 29(1), 175-178

ROBERTS-THOMSON, J. C.; STEVENS, D. P.; MAHMOUD, A. A. F.; WARREN, K. S. Giardiasis in the mouse: an animal model. Gastroenterology, Philadelphia, v.71, n.1, p.57-61, 1976.

Upcroft, J., and P. Upcroft. 1998. My favorite cell: Giardia. Bioessays
20:256–263.

URQUHART, G. M.; ARMAUR, J.; DUNCAN, J. L.; DUN, A. M.; JENNINGS, F. W. Veterinary parasitology. NewYork: Longman, 1987.

VIGNARD-ROSEZ, K. S. F. V.; ALVES, F. A. R.; BLEICH, I. M. Giardiase. 2006. Disponível em: <http://www.cepav.com.br/textos/t_giardia.htm>. Acesso em: 11 maio 2014






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terça-feira, 6 de maio de 2014

Agentes empregados no controle de ectoparasitas


     Os parasitos externos ocupam lugar de destaque entre as parasitoses dos animais domésticos. Estes ectoparasitos podem ser controlados com o uso de substâncias genericamente chamadas de praguicidas ou defensivos agrícolas. Estes termos são usados em agropecuária referindo-se às substâncias químicas capazes de destruir as pragas e recebem denominações específicas conforme seu emprego: inseticidas, carrapaticidas, pulicidas, piolhicidas, moluscicidas, etc.
Nos carnívoros domésticos, como cães e gatos, o maior desafio recai sobre o controle das pulgas, em que predominam o Ctenocephalides felis e C. canis, e das sarnas demodécica, causada pelo Demodex spp., e sarcóptica, provocada por Sarcoptes spp.
Devido ao alto custo de desenvolvimento de novos produtos, bases inseridas há décadas no mercado predominam até hoje quase absolutas. Em revisão criteriosa a respeito do lançamento de novas moléculas que atuam em ectoparasitos, constatou-se que poucas foram acrescidas à farmacopeia veterinária nesses últimos anos. Para a linha de produtos de atuação em pequenos animais, destaca-se a metaflumizona, inserida no mercado no ano de 2007.
Deve-se fazer uma correta orientação ao criador ou proprietário do animal quanto ao uso destes defensivos, pois a maioria não lê as bulas, e assim a propaganda comercial pode induzi-los à utilização errônea do produto, contribuindo, desta forma, para que haja um recrudescimento da resistência dos parasitos frente às moléculas. A subdosagem e a pressão de seleção, ou seja, a intensificação de aplicações dos antiparasitários, têm sido os principais fatores associados ao surgimento de cepas resistentes.
O aparecimento de resistência, portanto, é consequência do mau uso das formulação. Para evitá-lo, o usuário deve ter alguns cuidados básicos antes do manuseio destes agentes. O principal deles é a leitura criteriosa das recomendações sugeridas pelo fabricante antes da aplicação do produto, que é a fonte primária de informações atualizadas, pois o fabricante tem interesse em mostrar a eficiência e segurança do produto. Outra medida seria solicitar a orientação de um profissional da área, o médico veterinário, para adequar medidas de controle tático ou estratégico nos canis, gatis, ou casas dos proprietários, com a finalidade de elaborar um esquema que diminua a frequência de tratamentos associado ao manejo adequado dos animais. Esse profissional é capacitado para indicar o produto e a sua utilização correta.
A seguir, estão indicados os diferentes princípios ativos e suas associações.

ORGANOFOSFORADOS

Definição: São compostos orgânicos, derivados do ácido fosfórico. Os organofosforados são apresentados em formulações isoladas, apenas uma base, ou em associações com outras bases, particularmente com os piretroides.

Nomes genéricos dos ectoparasiticidas organofosforados: Coumafós, Diazinom e Fentiom.

Utilização: o Coumafós, quando em formulação isolada, é indicado para combater artrópodes em cães; o diazinom, por sua vez, é recomendado no controle das miíases dos animais, sendo usado sob a forma de xampu e coleira contra pulgas em cães e gatos; e o fentiom para cães e gatos, em duas diferentes concentrações, é recomendado para o controle de pulgas.

Modo de ação: os organofosforados se ligam “irreversivelmente” ao local esterásico da enzima colinesterase, responsável pela hidrólise da molécula de acetilcolina. Este processo resulta no acúmulo de acetilcolina nos locais onde este neurotransmissor é liberado, promovendo hiperexcitabilidade e hiperatividade, seguindo-se de incoordenação muscular, convulsões e morte do parasito.

Características farmacocinéticas: os organofosforados são absorvidos no trato intestinal, porém possuem um grau de instabilidade variável em meio alcalino, de modo que podem ser parcialmente hidrolisados nas áreas alcalinas do intestino delgado. Esses medicamentos são lipossolúveis, sendo facilmente absorvidos através da pele. Os organofosforados são rapidamente oxidados e inativados no fígado, sendo eliminados principalmente na urina.

Efeitos tóxicos: o índice de segurança é geralmente pequeno e, por este motivo, maior atenção deve ser dada ao uso correto da dose. Os principais efeitos tóxicos nos animais são letargia, anorexia, diarreia, polaciúria, vômitos, salivação e tremores musculares, estando relacionados com atividade prolongada da acetilcolina junto aos seus receptores muscarínicos e nicotínicos. O sulfato de atropina reduz parcialmente estes efeitos tóxicos, pois atua apenas como antagonista de receptores muscarínicos.

CARBAMATOS

Definição: são compostos derivados do ácido carbâmico, mais particularmente do ácido N-metilcarbâmico.

Nomes genéricos dos ectoparasiticidas carbamatos: carbarila e propoxur.

Utilização: carbarila e propoxur, utilizados isoladamente ou em associações, são indicados no combate de artrópodes em geral.

Modo de ação: os carbamatos são inibidores reversíveis da colinesterase, enquanto os organofosforados são “irreversíveis”. Os artrópodes expostos a esses agentes exibem hiperatividade, ataxia, convulsões e paralisia, seguida de morte.

Farmacocinética: os carbamatos em formulações para uso tópico são pouco absorvidos pela pele. Nos mamíferos, essas substâncias são biotransformadas no fígado e por esterases plasmáticas, sendo excretadas na urina.

Efeitos tóxicos: como são inibidores reversíveis da colinesterase, os efeitos dos carbamatos, de modo geral, têm menor duração e intensidade quando comparados aos dos organofosforados. O tratamento dos animais intoxicados deve ser feito exclusivamente com atropina, não devendo ser utilizados os reativadores das colinesterases, isto é, as oximas, como o Contrathion® (mesilato de pralidoxima). Isto porque os carbamatos se ligam a ambos os locais ativos da colinesterase (esterásico e aniônico), impedindo que as oximas reativem a enzima, como ocorre com os organofosforados. A forma mais comum de intoxicação, além do uso incorreto e a ingestão acidental, deve-se ao hábito dos animais de se lamberem após a aplicação do produto.

PIRETROIDES

Definição: são, em sua maioria, derivados do ácido ciclopropanocarboxílico, com algumas exceções, como o fenvalerato, por exemplo. São ésteres solúveis na maioria dos solventes orgânicos, são biodegradáveis têm a vantagem de serem estáveis quando expostos ao ar e à luz, diferentemente das piretrinas.

Nomes genéricos das piretrinas e piretroides: piretrina I, piretrina II, cialotrina, ciflutrina, cipermetrina, deltametrina ou decametrina, flumetrina e permetrina. Os piretroides que não têm o grupamento α-ciano são classificados como do tipo I (piretrina I, aletrina, tetrametrina, permetrina, resmetrina e fenotrina) e são utilizados comumente como inseticidas em ambientes domésticos, sob a forma de spray, e aqueles que têm são chamados do tipo II (cipermetrina, deltametrina, cifenotrina, fenvalerato, flumetrina e cialotrina), indicados como ectoparasiticidas para uso animal. Esta distinção é importante, pois, em caso de exposição tóxica, os sintomas observados entre os dois grupos diferem, devido a diferentes mecanismos de ação.

Utilização: os piretroides são utilizados, de modo geral, no combate a artrópodes. São apresentados em formulações isoladas ou em associações com outros agentes, particularmente com os organofosforados. Estas associações têm por finalidade aumentar o espectro de ação, visando principalmente à ação sobre os bernes, uma vez que os piretroides não são efetivos contra estes.
            O uso dessas moléculas incorporadas a xampus, particularmente pelo seu rápido efeito de knock-down (“queda”) em pulgas, tem aumentado consideravelmente em pequenos animais.
            Devido à resistência paralela e cruzada que vem sendo desenvolvida pelos parasitos aos piretroides, a eficácia destem tem variado bastante entre diferentes regiões geográficas e até dentro da mesma região. Hoje, poucos piretroides apresentam eficácia igual ou superior a 95%, índice exigido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) para sua aprovação como acaricida comercial.

Modo de ação: os piretroides têm propriedades lipofílicas que facilitam sua penetração nos artrópodes através de sua cutícula rica em lipídios. Uma vez absorvidos, os piretroides são levados pela hemolinfa para as células nervosas. O local de ação destes agentes é o canal de sódio destas células, aumentando a condutância deste íon. Os piretroides do tipo I prolongam o influxo de sódio e reduzem tanto o pico da corrente de sódio como o efluxo de potássio no estado de equilíbrio, provocando inquietação, incoordenação, fraqueza e paralisia. Os piretroides do tipo II causam despolarização da membrana nervosa sem descargas repetitivas e reduzem a amplitude do potencial de ação. Também se admite que essa classe atue como agonista em receptores colinérgicos nicotínicos e como antagonista nos do ácido γ-aminobutírico (GABA). Também foram descritas ações dos piretroides promovendo inibição de Ca²+, Mg²+-ATPase e sobre a calmodulina, responsável pela ligação intracelular dos íons de cálcio. Os insetos expostos a estes praguicidas apresentam hiperatividade, incoordenação e dificuldade de movimentos associada a hipersecreção, tremores, convulsão e, finalmente, o knock-down (“queda”), podendo ou não morrer.

Farmacocinética: os piretroides são pouco absorvidos pela pele, ocorrendo maior absorção pelas mucosas, particularmente dos tratos digestório e respiratório. Uma das principais vias de biotransformação é a hidrólise da molécula por carboxilesterases e oxidases da fração microssomal dos tecidos. A conjugação com sulfatos, glicuronídios, taurina, glicina e outras substâncias, no fígado, faz parte deste processo, que é semelhante em diversas espécies animais. As principais vias de eliminação são a fecal e a renal. Resíduos de piretroides e de seus metabólitos podem ser encontrados no leite semanas após a aplicação tópica.

Efeitos tóxicos: a toxicidade dos piretroides é bastante baixa quando comparada a outros ectoparasiticidas. Seu efeito tóxico é sobre o sistema nervoso, sendo dependente das propriedades físico-químicas de cada agente, da dose e do intervalo de tempo entre as aplicações.
            A atividade inseticida dos piretroides pode ser aumentada com a adição de algumas substâncias que, embora não tenham ação inseticida, competem com os piretroides pela mesma via metabólica, potencializando os efeitos tóxicos deste sobre os mamíferos. Os sinergistas mais comumente usados em formulações de piretroides são o butóxido de piperonila, o N-octil-diciclohepteno-dicarboximida (MGK 264), o sulfóxido, o sesomim e o sesomolim. Da mesma forma, os efeitos dos piretroides aumentam quando associados a organofosforados e carbamatos, devido à inibição de esterases causada por estes últimos.
            Animais que recebem doses tóxicas agudas de piretroides do tipo I produzem a síndrome “T”, caracterizada por hiperexcitação, agressividade, tremores, fraqueza e resposta de sobressalto, enquanto os piretroides do tipo II produzem a síndrome “CS”, cujos sinais clínicos são: coreoatetose, salivação profunda, movimento de pedalar, convulsões clônicas, incoordenação e desorientação. Estes sintomas podem aparecer poucas horas após a exposição a essas substâncias.
            O tratamento inicial consiste em evitar maior absorção do piretroide, recomendando-se banho com água acrescida de detergente neutro. Os sintomas de excitação podem ser controlados com benzodiazepínicos (como Valium®) ou barbitúricos, no caso de convulsão. Carvão ativado, associado a um catártico osmótico, como o sulfato de sódio ou de magnésio, auxilia na inativação e remoção do piretroide do aparelho digestório.

FORMAMIDINAS

Definição: é um composto formamidínico.

Nomes genéricos: clordimeform e amitraz. O amitraz representa o princípio ativo ais utilizado entre as formamidinas, inclusive no Brasil, por ser o único aprovado para uso animal.

Utilização: o amitraz possui uma excelente ação sobre artrópodes, de maneira geral. É utilizado como carrapaticida, pulicida, piolhicida e sarnicida. O amitraz mostra-se um dos mais efetivos carrapaticidas do momento.

Modo de ação: ainda não foi totalmente esclarecido. Observou-se que, em larvas de carrapato, o amitraz penetra rapidamente, podendo atuar sob a forma original ou de seu metabólito ativo inibindo a monoaminoxidase (MAO). Esta enzima mitocondrial tem ação catalisadora no processo de desaminação de catecolaminas, resultando no aumento dos níveis de norepinefrina e serotonina no sistema nervoso central. Há evidências também de sua ação direta em canais de sódio da membrana nervosa e ação inibidora sobre a síntese das prostaglandinas. Ainda, como seu efeito agonista em receptores α2-adrenérgicos, tem sido estudado e confirmado por meio do uso de antagonistas α2-adrenérgicos, tanto em cães quanto em gatos que receberam amitraz via intravenosa.
            Nas teleóginas, as formamidinas inibem o processo de liberação de ovos, por impedir a contração de sua musculatura genital.

Farmacocinética/farmacodinâmica: por via oral, o amitraz é rapidamente hidrolisado no estômago, em consequência da sua instabilidade em meio ácido, por se tratar de uma base fraca. A sua biotransformação ocorre no fígado, sendo os seus metabílitos excretados por vias renais e biliares. A absorção pela pele é tanto maior quanto maior for o grau de lesão e inflamação desta, embora seja absorvido, em menor quantidade, também pela pele íntegra.

Efeitos tóxicos: O amitraz, em comparação com os organofosforados e os carbamatos, é considerado pouco tóxico. É muito instável em meio ácido. Os subprodutos de sua hidrólise são bem mais tóxicos, razão pela qual a aplicação deve ser feita imediatamente após a sua preparação. Os solventes orgânicos nos quais o produto é diluído também podem contribuir para a maior absorção do produto e, consequentemente, maiores efeitos tóxicos. Torna-se muito tóxico quando misturado em óleos vegetais, para formulações pour-on, particularmente as “caseiras”. Recentemente, pesquisas têm sido elaboradas com o objetivo de abolir este efeito tóxico.
            Os principais sinais clínicos nos animais intoxicados, particularmente no cão, são ataxia, incoordenação, sonolência, depressão, bradicardia, hipotermia, midríase, êmese e diarreia. Eritema, hemorragia nas patas e prurido também podem ocorrer após a aplicação do amitraz, sendo este último decorrente dos parasitos mortos na pele. A ocorrência de hiperglicemia após sua aplicação em cães se deve à interferência na liberação de insulina pelas ilhotas de Langerhans, sendo por isso contraindicado seu uso naqueles portadores de diabetes melito.
            O tratamento da intoxicação deve ser sintomático e concomitante com as medidas de remoção do amitraz do organismo animal. Além desses cuidados, recomenda-se, para reversão rápida do quadro tóxico, o uso de antagonistas α2-adrenérgicos tais como ioimbina (Yobine®), na concentração de 2 mg/ml e dose de 0,1 mg/kg, ou do atipamezol (Antisedan®), na concentração de 5 mg/ml e dose de 0,2 mg/kg, ambos por via intravenosa.

LACTONAS MACROCÍCLICAS

Neste grupo, encontram-se as avermectinas e milbemicinas. Recentemente, foram lançados no mercado as espinosinas e os espinosoides, que não serão descritos a seguir por serem utilizados principalmente em bovinos, e não em cães e gatos.
                       
ü    AVERMECTINAS E MILBEMICINAS

Denominam-se endectocidas devido a seu amplo espectro de ação, isto é, combatem tanto os endoparasitos como os ectoparasitos, constituindo-se na última geração de praguicidas.

Nomes genéricos: as avermectinas utilizadas como ectoparasiticidas são a ivermectina, abamectina e doramectina; dentre as milbemicinas têm-se a milbemicina e a moxidectina. A selamectina, para cães e gatos, faz parte da recente geração dessa classe. No intuito de aproveitamento da excelente eficácia das avermectinas, associações visando ampliar seu espectro de ação como ectoparasiticida já são aprovadas oficialmente pela União Europeia, como, por exemplo, moxidectina e imidaclopride.

Utilização: embora estas moléculas sejam oriundas de substratos semelhantes, da fermentação do fungo do Streptomyces spp., os produtos ou as misturas das frações obtidas desta fermentação mostram algumas diferenças em sua eficácia, quando testadas nas diversas espécies de endo- ou ectoparasitos.

Modo de ação: propõe-se que as lactonas macrocíclicas potencializem a ação inibidora neuronal mediada pelo GABA, promovendo hiperpolarização do neurônio e, portanto, inibindo a transmissão nervosa. Este mecanismo de ação seria efetivo em mamíferos; entretanto, foi demonstrado que, em insetos, existe também a ação desses compostos em canais de cloro GABA independentes, em que há aumento na condutância da membrana do músculo, pelo bloqueio, para a resposta do ácido ibotênico, que é um ativador específico do portão-glutamato, comumente encontrado no inseto. Como consequência, há um aumento da permeabilidade da membrana aos íons cloro, resultando em redução da resistência da membrana celular.  Desta forma, essas moléculas provocam ataxia e paralisia nos insetos e nematódeos, enquanto mamíferos intoxicados exibem depressões neurológica e respiratória, incoordenação e tremores, evoluindo para ataxia e coma. As raças de cães mais sensíveis a intoxicação por esses agentes, como Collies e Pastor australiano, têm a glicoproteína-P “incompleta” (proteína responsável pelo efluxo desses agentes do sistema nervoso central), apresentando assim quadro toxicológico muito grave, podendo ser muitas vezes fatal.

Farmacocinética: já descrita em “Agentes Antinematódeos”.

Efeitos tóxicos: já descrito em “Agentes Antinematódeos”.

DERIVADOS DAS CLORONICOTIL NITROGUANIDINAS

ü    IMIDACLOPRID

O imidacloprid é uma molécula com atividade sistêmicae o primeiro composto da classe química das nitroguanidinas no mercado.

Utilização: é indicado como pulicida, na dose de 10 mg/kg de peso vivo para carnívoros, atuando nas espécies C. felis e C. canis, as principais espécies que acometem estes animais.

Modo de ação: interfere na transmissão de impulsos no sistema nervoso dos insetos. Esse agente exerce seu efeito ligando-se aos locais de receptores nicotínicos no neurônio pós-sináptico. Este mecanismo de ação é semelhante ao descrito para a acetilcolina, porém o imidacloprid não sofre a ação da acetilcolinesterase. Como é degradado lentamente, tem uma ação prolongada, levando o inseto à morte.

Farmacocinética: esse princípio é rápido e completamente absorvido pelo trato gastrintestinal, sendo distribuído uniformemente nos órgãos e tecidos.  Sua eliminação é muito rápida, sendo 96% da quantidade administrada nas primeiras 48 h; deste total, 70 a 90% são eliminados por via urinária e o restante pelas fezes.

Efeitos tóxicos: para cães, tanto fêmeas como machos, a concentração tolerada, sem quaisquer danos, foi determinada em 200 mg/kg na dieta, e mesmo a administração de 500 mg/kg de ingrediente ativo na dieta, por um período superior a 12 meses, não produziu efeitos colaterais. Em caso de ingestão ou erros de manipulação, a sintomatologia é similar à causada por intoxicação nicotínica: apatia, miotomia, dificuldade respiratória, bradicardia, queda de pressão arterial, tremores e, em casos graves de intoxicação, podem ocorrer mioespasmos. Por não existir um antídoto específico, o tratamento deve ser sintomático.  Medidas visando à eliminação ou ao aumento da excreção do ingrediente ativo, como lavagem gástrica e catárticos salinos, são recomendadas. Respiração artificial é necessária em caso de parada respiratória.

ü    NITEMPIRAM

O nitempiram, uma nitroenamina, é um pulicida adulticida cuja principal característica é a de oferecer um rápido knock-down.

Utilização:  é indicado como pulicida na dose de 1 mg/kg de peso vivo ao dia para cães e gatos.

Modo de ação: atua bloqueando os receptores nicotínicos de acetilcolina, porém não interfere na acetilcolinesterase. Sua degradação é muito rápida.

Farmacocinética: as concentrações sanguíneas máximas são alcançadas entre 15 minutos e uma hora após sua ingestão. Mais de 90% do princípio ativo são eliminados pela urina, dentro de 24 h em cães e 72 h em gatos. As pulgas sofrem os efeitos do produto 30 a 60 minutos após sua administração.

Efeitos tóxicos: doses diárias cinco vezes superiores à recomendada, administradas para filhotes de cães e gatos, não produziram intoxicação. Sintomas adversos, como fezes amolecidas e exacerbação na frequência do ato de lamber-se, foram observados quando se utilizaram estes níveis de dosagem duplicados. O tratamento nestes casos deve ser sintomático, por não existir um antídoto específico. O produto não é recomendado para uso em animais com menos de 4 semanas.

MISCELÂNEA DE MEDICAMENTOS ECTOPARASITIDAS

ü    INIBIDORES DE QUITINA

A benzoilfenilureia é um inseticida seletivo que atua pela inibição da deposição da quitina. Os artrópodes afetados são incapazes de promover a ecdise, perdem hemolinfa, adquirem coloração escura e morrem devido à desidratação. Dos compostos inibidores de quitina, uma base disponível no mercado brasileiro para carnívoros, como cães e gatos,  é o lufenurom, pulicida administrado por via oral.

ü    DERIVADOS DOS FENILPIRAZÓIS

O fipronil é uma molécula recém-introduzida em nosso mercado, sendo um ectoparasiticida indicado contra Ctenocephalides spp. E Rhipicephalus sanguineus em cães e gatos. O fipronil inibe não competitivamente o GABA, fixando-se ao receptor no interior do canal do cloro, inibindo o fluxo celular dos íons, anulando assim o efeito neurorregulador do GABA e causando a morte do parasito por hiperexcitação.

ü    ANÁLOGOS DO HORMÔNIO JUVENIL

O metoprene é um análogo sintético do hormônio juvenil que promove a mudança de estágios nos insetos. A molécula age mimetizando este hormônio regulador do crescimento, impedindo que os insetos atinjam a maturidade ao interromper o desenvolvimento larval, resultando em sua morte. Sua segurança baseia-se no fato de que hospedeiros mamíferos não têm sistemas similares de desenvolvimento que possam ser afetados por este agente. Outra molécula desse grupo é o piriproxifém. Comercialmente, o metoprene é oferecido em associação com DDVP + propoxur em formulação spray, sendo indicado como larvicida de pulgas.

NOVAS MOLÉCULAS: SEMICARBAZONAS

Definição: a metaflumizona, um derivado pirazólico com ação bloqueadora dos canais de sódio dos insetos, foi lançada para controlar pulgas em gatos e pulgas e carrapatos em cães. A metaflumizona pertence ao grupo das semicarbazonas, sendo sintetizada a partir da modificação do anel pirazolina, e apresenta-se comercialmente em formulações como único princípio ativo ou em associação com o amitraz.

Nome genérico das semicarbazonas: metaflumizona.

Utilização: a metaflumizona é comercializada na forma de spot-on indicada para controle de pulgas de cães e gatos e para o tratamento da escabiose canina. Em associação com o amitraz, é indicada no controle do carrapato Rhipicephalus sanguineus no cão. Embora não seja indicada pelos fabricantes, a associação metaflumizona/amitraz demonstrou ser promissora no tratamento da demodicidose canina, inclusive quando da infecção concomitante por Malassezia pachydermatis.

Modo de ação: as semicarbazonas bloqueiam os canais de sódio voltagem-dependentes, impedindo a passagem do eletrólito através das membranas das células nervosas. Este processo resulta na falta de impulsos nervosos promovendo a paralisia e morte dos artrópodes.

Farmacocinética/farmacodinâmica: a metaflumizona tem baixa absorção, em aplicação tanto oral, quanto tópica, sendo excretada principalmente por via fecal (acima de 90% da dose) e em pequenas quantidades via bile e urina.

Efeitos tóxicos: o agente tem toxicidade, teratogenicidade e oncogenicidade baixas. Mesmo quando aplicada na dose cinco vezes maior que a recomendada em sete aplicações tópicas com intervalos quinzenais, a metaflumizona não ocasionou efeitos colaterais em gatos adultos e jovens. Da mesma forma, o agente é bem tolerado e não ocasiona efeitos adversos em cães.